Bancos elevam lucros, mas não melhora atendimento
Depois que a inflação foidomada no país, os bancos encontraram na cobrança de tarifas a alternativa menos arriscada para garantir os sucessivos recordes de rentabilidade. Desde 1994, com a adoção do Plano Real, foram criadas diversas taxas —como para Abertura de Crédito (TAC) e de Emissão de Carnê (TEC). Serviços que antes eram oferecidos gratuitamente passaram a ser cobrados. Nos 12 maiores bancos do país, o aumento desenfreado das tarifas está garantindo o pagamento de toda a despesa com pessoal e ainda sobra dinheiro para engordar os lucros. Órgãos de defesa do consumidor consideram as taxas abusivas, mas ressaltam que não há nenhuma resolução do Banco Central (BC) que controle os preços. Por isso, os clientes bancários precisam ficar atentos para não pagar valores indevidamente. A automação trouxe comodidade para o cliente, mas não serviu para baratear preços ou melhorar o atendimento ao público. Segundo o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro de Oliveira, o valor das tarifas não cai por causa da ineficiência dos bancos e da falta de concorrência, além da acomodação dos clientes bancários, que não acompanham as taxas debitadas em suas contas. Enquanto isso, a arrecadação de tarifas não pára de crescer. Uma pesquisa do Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração (Inepad) mostra que, até setembro de 2005, os 12 maiores bancos do país receberam R$ 28,118 bilhões com prestação de serviços, superando com folga os gastos com salários, que chegaram a R$ 23,455 bilhões. A sobra de caixa, que nesse caso foi de R$ 4,663 bilhões, ajudou a engordar os lucros. Em 2000, o cenário havia sido bem diferente: os bancos analisados conseguiram cobrir apenas 79% das despesas de pessoal com a arrecadação de tarifas. No Banco do Brasil, o índice de cobertura das despesas com funcionários usando as receitas de prestação de serviços atingiu 103% nos nove primeiros meses de 2005. Esse resultado reflete uma arrecadação de tarifas de R$ 5,645 bilhões e despesas de R$ 5,438 bilhões. Independentemente desses números, a assessoria de imprensa do BB garante que o banco sempre cobrou as taxas mais baixas do mercado. Os bancos privados Itaú e Unibanco quase dobraram a relação. Os percentuais atingiram as marcas de 188% e 170%, respectivamente. Segundo o analista financeiro do Inepad, Edson Carminatti, a tendência é que a relação entre tarifas e despesas com pessoal se distancie cada vez mais, principalmente por causa do uso de novas tecnologias. O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socio-Econômicos (Dieese) atribui a má qualidade do atendimento e as longas filas à falta de contratação de novos funcionários e à ampliação da base de clientes dos bancos. Segundo Ana Quitéria, economista do Dieese em Brasília, de 1994 a 2003, o número de bancários caiu de 571 mil para 399 mil de acordo com dados do Ministério do Trabalho. “Os serviços nas agências foram enxugados e houve muita demissão de bancários”, explica. A economista tem dados que demonstram o reajuste das tarifas muito além da inflação. O INPC acumulado de 1994 a 2004 foi de 139%, enquanto o preço dos serviços avançou 483%. A despesa com pessoal subiu apenas 43% no mesmo período. Clientes A alta rentabilidade dos bancos com tarifas veio acompanhada de maior insatisfação dos clientes e redução no quadro de funcionários. O número de reclamações nos órgãos de defesa do consumidor e no BC contra a má qualidade e demora no atendimento subiu consideravelmente. O professor norte-americano John Roscol, de 47 anos, mora há cinco em Brasília e não entende o motivo das grandes filas. Tampouco compreende porque, apesar de todo o investimento em tecnologia, a compensação de cheques de outros estados demora tanto. “Deveria ser automática. Além disso, as filas são grandes. Nos Estados Unidos, se você perder cinco minutos na fila, recebe US$ 5. Aqui no Brasil, o cliente está em último lugar”, reclama. O casal Almeri Paiva (48 anos) e Eudes de Souza (47 anos) foram mais radicais para controlar os gastos de tarifas: simplesmente desistiram de movimentar dinheiro na conta corrente. “Procuro evitar cartão de crédito e prefiro utilizar apenas o de débito, que não tem incidência de tarifa. Não vou alimentar banco com meu dinheiro”, afirma Almeri. Defesa do consumidor O técnico de Defesa do Consumidor do Procon-SP Diógenes Donizeti Silva considera um absurdo a criação de taxas como TAC e TEC e a cobrança de extratos bancários, que há 10 anos eram oferecidos gratuitamente — hoje, os clientes têm um limite de extratos. “Para liquidar um contrato em alguns bancos, o cliente tem que pagar R$ 450. Isso é absurdo”, reclama. Segundo Diógenes, os consumidores precisam estar atentos às tarifas debitadas nas contas e verificar se a cesta de serviços, oferecida pelos bancos, realmente proporciona o menor valor para evitar o pagamento de serviços que não estão sendo utilizados. É preciso estar de olho em cada detalhe e pedir informações sobre cobrança de taxas desconhecidas. Segundo o técnico do Procon, não adianta muito mudar de banco em busca de tarifas menores. Como a competição entre os bancos é muito pequena, todos cobram os mesmos valores em média. “A cada balanço patrimonial, os bancos estão batendo recordes de lucro. Eles perderam a visão social da prestação de serviço”, diz Silva. Correio Braziliense - 29/01/2006