Cresce cerco ao Banco do Vaticano, suspeito por lavagem de dinheiro
Uma investigação na Sicília sobre uma suspeita de fraude e lavagem de dinheiro envolvendo um padre da Igreja Católica e possivelmente a máfia, vem contribuindo para as pressões para que o Vaticano alinhe suas operações bancárias, às vezes sigilosas, aos padrões globais. A polícia italiana fez seis prisões na semana passada ligadas ao padre Orazio Bonaccorsi, que teria usado uma conta no nome do Banco do Vaticano para ajudar seu pai a lavar ? 250.000 que ele conseguiu da União Europeia, a título de financiamento de um projeto de criação de peixes supostamente não existente. Após passar pela conta como doação a "caridade" em 2006, o dinheiro teria retornado para a Sicília para ser sacado por um tio anteriormente condenado por associação com a máfia. Perguntado sobre o assunto, Ettore Gotti Tedeschi, presidente do Institute of Religious Works (IOR), como o Banco do Vaticano é conhecido formalmente, respondeu: "Sem comentários. O fato diz respeito a coisas do passado. Isso não poderia acontecer mais". Gotti Tedeschi, que dá aulas sobre ética nas finanças, foi nomeado pelo papa Bento XVI no ano passado com a instrução para apagar o passado às vezes nebuloso do IOR, através de uma maior transparência e adoção de normas internacionais. Funcionários do governo italiano disseram que Gotti está se movimentando na direção certa, mas a escala de sua missão foi enfatizada em setembro, quando uma investigação separada em Roma resultou no congelamento de ? 23 milhões (US$ 32 milhões) mantidos pelo IOR em uma agência do banco italiano Credito Artigiano em Roma. O IOR foi acusado de violar as regras italianas contra a lavagem de dinheiro, ao tentar fazer duas transferências sem fornecer detalhes adequados sobre os beneficiários pretendidos, ou os motivos das transferências. O Vaticano disse que houve um "mal entendido" com o Credito Artigiano. Funcionários que pediram para não ser identificados disseram que investigadores em Roma apoiados pelo Banco da Itália, aumentaram a investigação de lá para cá e examinaram dois saques feitos pelo IOR no total de ? 900.000, de contas que ele mantinha no Intesa Sanpaolo e no UniCredit, os dois maiores bancos da Itália. O Intesa e o UniCredit não comentaram. Funcionários do governo italiano acreditam que as investigações e as pressões de Mario Draghi, presidente do banco central italiano, vão ajudar e não atrapalhar os esforços de Gotti Tedeschi para colocar o Vaticano na era moderna. Esses funcionários chamam atenção para uma troca recente de cartas entre Gotti Tedeschi e a Financial Action Task Force de Paris, com a qual o Banco do Vaticano se comprometeu a adotar medidas contra a lavagem de dinheiro estabelecidas pela força tarefa. Esse processo demorado envolveria a aprovação pelo Vaticano de uma legislação contra a lavagem de dinheiro e o estabelecimento do equivalente à Unidade de Inteligência Financeira do Banco da Itália, para monitorar as atividades do IOR. Separadamente, um porta-voz de Olli Rehn, comissário de assuntos monetários da União Europeia, disse à "Bloomberg" que o Vaticano demonstrou seu compromisso com a implementação este ano de leis da UE contra a lavagem e fraudes financeiras. O papa deverá nomear o cardeal Attilio Nicora para atuar como uma espécie de banqueiro central com uma função reguladora sobre o IOR. "O IOR não pode mais trabalhar assim", disse um funcionário do governo italiano ao "Financial Times". "As pessoas vêm usando o IOR como uma cortina. O que há por trás da cortina? Esse é o mecanismo que estamos tentando desmantelar." Um segundo funcionário citou o caso siciliano como exemplo de como as autoridades italianas estão preocupadas com o possível abuso envolvendo contas do IOR mantidas em bancos italianos para disfarçar a trilha de transferências de dinheiro. O Banco da Itália, que ajudou na investigação na Sicília, emitiu dois memorandos aos bancos italianos este ano, lembrando-os para que implementem medidas contra a lavagem de dinheiro em operações realizadas para o IOR. O IOR não publica sua contabilidade, mas teria ? 5 bilhões em ativos. Ele realiza operações bancárias para o staff do Vaticano, operações de caridade e missões espalhadas pelo mundo. Fonte: Financial Times, por Guy Dinmore, de Roma (Publicado no Valor Econômico)